Developer: Xbox Game Studios, Double Fine Productions
Plataforma: Xbox Series X|S, Xbox One, PlayStation 4, PlayStation 5, PC
Data de Lançamento: 25 de Agosto de 2021
A chegada de Psychonauts 2 será certamente um dia de festa para todos os que esperaram 16 anos para ver uma sucessão do jogo original e também para aqueles, como eu, que não tinham jogado o primeiro, mas tinham ficado com grande curiosidade para ver o que a equipa da Double Fine tinha feito com um jogo que se tornou de culto.
Para perceber este fenómeno, temos de recuar até 2005, quando Psychonauts foi lançado, mas não vendeu tanto como se esperava. No entanto, as boas críticas ao jogo levaram a que este fosse considerado um jogo de culto para muitos jogadores que esperavam ansiosamente por um sucessor. Entre avanços e recuos durante década e meia, foi com um empurrãozinho da Xbox Games Studios, que se reuniram as condições necessárias para mais uma criação de Tim Schafer ver a luz do dia. O criador de Broken Age ou Grim Fandango trabalhou nos últimos anos para trazer um jogo que fizesse jus ao hype criado por todos. Será que conseguiu? É isso que vamos descobrir com esta cópia que nos foi cedida pela Microsoft e pela Xbox Portugal.
A história de Psychonauts 2 segue os acontecimentos do jogo original, mas não se preocupem se não o jogaram porque há um resumo de tudo o que aconteceu antes. Isto serve para enquadrar os novos jogadores e para lembrar aqueles que já não pegavam nisto desde 2005, sem esquecer o jogo de realidade virtual, Psychonauts In the Rhombus of Ruin, que serviu apenas de aperitivo.
O resumo dos acontecimentos mostra que Razputin, ou Raz para os amigos, é o nosso pequeno personagem principal que tem apenas 10 anos e fugiu de uma vida no circo para entrar num acampamento de verão disfarçado e dedicado a treinar miúdos com habilidades psíquicas especiais que Raz já sabia que tinha, mas não as sabia controlar. Esse acampamento era, no fundo, um treino intensivo para os jovens entrarem nos Psychonauts, uma organização internacional de espionagem psíquica.
É aqui que as coisas aquecem porque este grupo de agentes parece estar com problemas, nomeadamente porque há uma toupeira infiltrada no grupo que está a tentar ressuscitar um dos assassinos psíquicos mais perigosos que dá pelo nome de Maligula. No papel de Raz temos então uma grande aventura pela frente para descobrir quem é o traidor do grupo e repor a ordem na organização. É fácil de perceber que um miúdo de 10 anos vai ser olhado com descrédito no início, mas aos poucos vai ganhando o seu espaço e a sua importância será claramente notada.
Psychonauts 2 leva-nos para temas relacionados com a mente e certas perturbações que estas têm de modo a influenciar o comportamento das pessoas. Apesar do assunto ser sério, o jogo aborda o tema com muito humor e não era nada fácil fazer isto quando se aborda a saúde mental. A Double Fine conseguiu tratar tudo com o devido respeito e preocupação com o bem estar destas pessoas. Não raras vezes vão encontrar personagens com vários problemas, cada um com as suas construções mentais específicas, para as quais somos lançados sem ter de julgar, apenas experienciar e poder alterar um ou outro pensamento menos bom.
O jogo parece uma série de desenhos animados que estamos a ver na televisão e quem sabe se isso não vai acontecer com tanta adaptação que tem sido feita a partir de videojogos. O mundo de Psychonauts 2 está muito bem feito e tem uma identidade própria no estilo de arte que utiliza. O jogo segue uma linha fechada de história, mas tem partes em que podemos explorar várias áreas e até conversar com diversos personagens de modo a descobrir mais sobre a história do jogo, ou mesmo só para entrar na mente de outras pessoas e ver formas distorcidas, mas divertidas, da realidade. Nem sempre é fácil perceber em que grau mental estamos, se na realidade, se dentro da mente de alguém, tal como o filme Inception fazia com os sonhos, onde em alguns momentos nos baralhava entre o que era real ou não.

São essas viagens mentais que vão acontecer nos níveis do jogo. Cada mente terá as suas particularidades específicas e pensamentos exagerados. No início somos levados a um tutorial na mente do Dr. Loboto, um autêntico labirinto repleto de dentes e gengivas, ou não fosse ele um dentista. Depois seremos levados até às mentes de outras personagens, o que nos vai fazer andar por cenários impressionantes e disruptivos. Sem querer estragar surpresas, um dos primeiros é uma viagem à mente de Hollis, uma das agentes dos Psychonauts. Primeiro vamos fazê-la mudar de ideias com ligações entre palavras chave que a vai levar a mudar a maneira de pensar, depois somos empurrados para uma espécie de Hospital-Casino, no qual teremos de resolver várias questões de jogos de sorte (ou azar) que estão viciados para nunca se ganhar. O cenário é hilariante. Há doentes de cama a jogar em máquinas, há outros a apostar na roleta, entre outras situações bizarras.
Há grande diversidade de puzzles e bastantes quebra-cabeças quando temos de ligar as tais palavras-chave entre si para fazer sentido e alterar linhas de pensamento de alguns personagens. Imaginem ter uma palavra a dizer sorte e depois outra a dizer sabedoria e prudência. Ligar essas palavras pode querer dizer que para se ter sorte, primeiro precisamos de ter alguma sabedoria e que por vezes é necessário alguma prudência na hora de arriscar uma aposta que pode acabar mal. O próprio jogo ajuda a completar estes esquemas se não tivermos a dar com o caminho certo, mas gostei bastante de parar para pensar no que fazia mais sentido. Às vezes acertava, outras vezes nem por isso, mas normalmente, depois de falhar, percebia logo que não podia ser daquela maneira.

Depois há todos os outros mini-jogos que são a essência da diversidade deste Psychonauts 2. Andei numa máquina que parecia de pimbal em cima de um comprimido até acertar num coração, fiz uma corrida com o naipe de copas em cima de linhas de monitorização de respiração de doentes, andei dentro de Raios-X, fiz de concorrente a chefe de culinária como se estivesse no Masterchef, entre muitas outras coisas. Por este tipo de exemplos, já perceberam que podem esperar o inesperado em cada momento do jogo e isso é maravilhoso.
Entre os níveis, temos acesso a uma área central, uma espécie de Centro de Comando dos Psychonauts. É lá que passamos o tempo a explorar, falar com várias personagens e ver a história a ganhar forma para nos dar acesso aos níveis. Há salas de agentes, salas de aula, cantina, cabeleireiro, uma central de correspondência, entre muitas outras coisas. Devo dizer que senti grande liberdade quando estava com Raz a andar por ali a falar com as pessoas e com acesso a várias linhas de texto que podia escolher para iniciar conversas que podiam, ou não, ser interessantes. É também numa dessas áreas que vamos poder repetir um certo nível que já concluímos. Na segunda vez que o visitarmos, já não está mesmo igual, devido às alterações mentais que já aconteceram depois de lá estarmos, mas descansem que os artefactos e os colecionáveis, que são bastantes, mantêm-se lá.

É claro que isto não é só andar para a frente sem ter de combater. Há vários inimigos e nós teremos vários poderes que vamos aprendendo para usar em diferentes situações. Além do básico combate corpo a corpo à boa moda deste tipo de jogos, com murros ou rodopios à Crash Bandicoot, existem os poderes psíquicos extra, que além de servirem para combate, muitas vezes servem para desbloquear acessos a outras áreas. Podemos equipar até 4 destes poderes em simultâneo e colocá-los no botão que nos der mais jeito. RB, RT, LB e LT, no caso da Xbox. Optei por ter quase sempre os mesmo padrões para não me baralhar nas lutas, mas no início andei aos papéis porque um poder que era num botão, depois já estava noutro. Achei boa ideia a personalização para dar mais opções aos jogadores, mas tem esse se não.
Entre os vários truques, podemos criar uma bola de fogo para nos ajudar a queimar inimigos, ou quadros que tapam uma passagem, teremos também a clarividência que nos transporta para as mentes de outros personagens, uma ferramenta que agarra objetos e os atira contra os inimigos, levitar para andar mais rápido ou fazer saltos de maiores distâncias, entre outras coisas possíveis. Estes poderes podem ser evoluídos à medida que vamos avançando na aventura. Outro tipo de coisas que podemos equipar são os pins. Podemos ter três em simultâneo e o objetivo é dar-nos algumas vantagens em determinado tipo de situação, como por exemplo, um que evidencia artefactos. Outros são só cómicos e fofos, como é o caso de um que dá para fazer festas em animais.
Dos inimigos, existem os mais banais que aparecem ao longo dos níveis, mas depois temos os bosses no final de cada segmento de níveis. São lutas que podem demorar algum tempo contra personagens muito interessantes na sua forma, por exemplo um polvo que joga blackjack. Tal como em outros jogos deste género, a luta faz-se por vagas e quanto mais fraco vai ficando o boss, mais difícil é escapar com vida. Às vezes é mesmo muito complicado, mas fiquem descansados que se não conseguirem passar podem colocar o jogo no modo invencível e aí não há desculpas para ficar “preso” em determinado boss.
Apesar destas lutas boas com os bosses serem boas, é na mecânica de combate que Psychonauts 2 falha um pouco. Não é assim tão intuitivo acertar em determinado inimigo e alguns poderes que estamos a usar têm uma eficácia muito aleatória. Por exemplo, se usarmos o poder especial de uma mão que agarra objetos é difícil escolher mesmo o que vamos mandar e a quem. Nas lutas com mais confusão então tudo se torna mais complicado, uma vez que não conseguimos controlar tudo o que queremos mesmo fazer.
A nível gráfico não há nada a apontar. O jogo foi otimizado para a nova geração, podendo chegar a atingir a resolução 4K e os 120 frames por segundo. O seu estilo inconfundível de arte lembra outros grandes jogos do género como Ratchet & Clank ou Spyro: The Dragon que são únicos em cada um dos seus mundos e com as suas próprias personagens. A sua sonoridade adequa-se ao mundo em que estamos inseridos e apesar de não ser algo que se torne épico, podemos ficar a trautear na cabeça algumas das trilhas que vamos ouvindo. O áudio dos personagens está em inglês, mas com tradução disponível para português do Brasil.
Psychonauts 2 é um dos jogos de plataformas mais divertidos que experimentei nos últimos tempos. Tem o seu estilo próprio e um humor bastante peculiar com personagens adoráveis e carismáticos. Tal como Crash, Ratchet ou Spyro, este ficará também na história como um dos melhores jogos de plataformas com um personagem que pode vir a tornar-se uma das bandeiras da Microsoft. Raz é um porreiro e sinceramente pode e deve ter um futuro risonho pela frente. Oxalá possa continuar a entrar na mente das pessoas e a fazer rir quem o rodeia.




