Developer: Firewalk Studios
Plataforma: PS5 e PC
Data de Lançamento: 23 de agosto de 2024
Este é daqueles jogos difíceis de analisar. E isso acontece porque há elementos em que o jogo roça a excelência, como é o caso das cut scenes, da renderização das personagens, dos gráficos apresentados nos vários mapas ou mesmo do voice acting e depois esbarra numa jogabilidade desajustada, injusta, desequilibrada, sem ritmo e com personagens e classes que são muito pouco interessantes. Mesmo assim, isso poderia resultar num jogo bastante interessante, não fosse o género em que se insere, o tal heroes shooter, depender totalmente de todas estas questões onde Concord fica muito aquém, pelo menos para mim, que estou habituado a que este género seja muito mais rápido e dinâmico.
A construção do mundo de Concord é, de fato, impressionante. Existe uma rica tapeçaria de histórias, locais e eventos históricos que se interligam. As cinemáticas são das melhores que temos visto por aí, demonstrando a capacidade da PlayStation 5, com a modelação das personagens muito bem concretizada e com uma sensação de um verdadeiro filme de animação que merece vários capítulos, com personagens que claramente vieram de vários planetas e poderão ter uma quantidade de episódios para contar, com as naves e os seus interiores muito bem estilizados. As próprias entradas em cena das nossas equipas com a nossa nave a entrar no planeta correspondente de cada mapa e a sua consequente animação e cinemática, também são do melhor que vamos encontrar no jogo.
No entanto, a história, os elementos da narrativa e das personagens acabam por estar lamentavelmente escondidos num menu de estilo de arquivo, afastados do núcleo da jogabilidade e não em cinemáticas como gostaríamos. Esse arquivo, aqui apelidado de Galactic Guide, é um mapa gigantesco da galáxia onde podem percorrer as rotas de todos os Freegunners e pontos-chave, como planetas ou asteróides, alguns deles onde estão situados os mapas do jogo, e é aqui que podemos ler sobre os personagens ou essas localizações, com novas entradas desbloqueadas jogando o jogo.
O conceito é interessante, mas não é a maneira ideal para ficarmos a conhecer o lore. O Galactic Guide acaba por ser um “despejar” de palavras que a maioria dos jogadores não tem interesse ou paciência em ler. Eu li algumas entradas e não achei muito interessante, e passei só a pairar sobre os pontos de descoberta para obter o XP e sair. A narrativa, que parece promissora na cena de abertura, rapidamente desaparece, tornando-se irrelevante para a experiência global.
As personagens jogáveis em Concord recebem o enigmático nome de “Freegunners“. Em jogos como Valorant, temos os “Agentes”; em Overwatch, os “Heróis”. Já em Concord, os “Freegunners” são essencialmente corsários espaciais ou revolucionários, dependendo de como os vejamos, que percorrem o cosmos em busca de fama, libertação e recursos. Embora a premissa não seja má, especialmente com a diversidade de espécies alienígenas na equipa, o design visual dos personagens é extremamente desinspirado. A falta de apelo visual torna difícil sentir qualquer conexão com eles, a menos que a diversidade seja o único critério de avaliação.
No que toca aos visuais, Concord brilha. A interface de utilizador é elegante e futurista, e os mapas são verdadeiramente impressionantes. No entanto, num jogo de heróis atiradores, o design de personagens é crucial, e é aqui que Concord desilude. Os personagens carecem de apelo e parecem quase deliberadamente genéricos, o que é difícil de compreender.
É difícil não olhar para qualquer uma das personagens do jogo e não pensarmos que já os vimos em algum lado, mas com aquele sentimento de knock off, sabem?! Desde Os Guardiões da Galáxia em corpos diferentes, a versão feminina do Nocturne, o robot do Borderlands em esteróides, a rapariga do Overwatch obesa, o cowboy do Apex colorido, e por aí adiante.
Concord oferece três modos de jogo distintos:
1. Brawl: O objetivo aqui é derrotar a equipa adversária, acumulando o maior número possível de takedowns. Este modo frenético testa tanto as habilidades individuais dos jogadores como a coordenação em equipa.
2. Rivalry (Cargo Run e Clash Point): Este modo divide-se em duas subcategorias. Em Cargo Run, os jogadores têm de plantar uma bomba e defender a área até à ativação. Já em Clash Point, o foco é a captura de zonas e a eliminação de rivais.
3. Takeover: Aqui, o objetivo é capturar e defender pontos específicos no mapa. A estratégia é fundamental, pois a equipa precisa de coordenar movimentos e habilidades para dominar o campo de batalha.
Para além destes modos, temos ainda um modo Treino, bastante oco, e um Modo Time Trials, que vai desbloqueando desafios conforme vamos subindo no nosso nível de experiência. Estes desafios até são engraçados e são, talvez, a melhor forma de aprenderem alguma coisa sobre as personagens, as suas habilidades e aptências, visto que, cada um dos desafios é com uma personagem diferente, apesar de não existirem desafios suficientes para todas as personagens do jogo.
A jogabilidade de Concord será decepcionante para um jogador habituado a Overwatch, Apex Legends, Valorant ou até mesmo de um Destiny. Para esses, tal como eu, o jogo é lento. Desde a forma como os personagens se movem até ao ritmo das batalhas, tudo parece arrastar-se. A falta de impulso faz com que o jogo se torne uma tarefa, ao contrário de títulos como Paladins ou Valorant, que mantêm o jogador “ligado” com tomadas de decisões rápidas. A mecânica de cura acaba por ajudar ainda mais o jogo é ser aborrecido.
Em Concord as únicas formas de curarmos a nossa personagem é através de uma habilidade própria, que só algumas personagens têm, seja em forma de habilidade pura e dura ou de colocar um artifício no chão que algumas personagens conseguem fazer, quer seja através de um módulo de vida que pode ser resgatado ou de um campo de cura ativado em determinada distância. Para além disso existem alguns pontos espalhados pelo mapa com os ditos power ups de cura que são partilhados pelo vosso esquadrão, o que faz com que, se outro elemento da vossa equipa apanhar o power up, ou tenham que esperar pelo cooldown ou tenham que procurar por outro ponto. Só que não vão ter tempo para isso, porque entretanto já morreram de qualquer maneira.
É difícil de perceber o rácio de dano que infligimos nos nossos adversários perante as armas que utilizamos, sentindo que, muitas vezes, estamos a disparar em adversários esponja que não morrem por nada deste mundo, enquanto que, nós morremos com um par de tiros. O que também não deve ajudar muito é o facto de, durante o nosso teste, estarmos constantemente a jogar com equipas com níveis bastante superiores ao nosso, sentindo ainda mais esse desnível, culpa de um match making claramente deficitário nesta altura do campeonato.
Embora cada Freegunner tenha um papel e uma classe designados, descobrir isso é um desafio. O “tutorial” é apenas um menu suspenso de termos e definições, deixando muito a desejar. Além disso, as bonificações de esquadrão que surgem durante o jogo são mal explicadas, dificultando a sua compreensão e utilização eficaz.
Cada personagem vem equipado com uma arma principal, uma secundária opcional e duas habilidades. Embora algumas armas e habilidades sejam interessantes, outras parecem genéricas e pouco inspiradas. Notavelmente, o jogo não inclui habilidades definitivas, o que elimina a emoção e a imprevisibilidade que muitos outros shooters de heróis oferecem.
No entanto, a jogabilidade poderá eventualmente agradar a outro estilo de jogadores que procura algo mais espaçado, mais lento, menos frenético e descomplexado. Acredito que a curva de aprendizagem do jogo possa ser bastante maior devido a este ritmo e que com um equilíbrio maior nas classes das personagens e do seu rácio de dano que a experiência possa ser mais uniforme e interessante.
Apesar de todos os problemas, Concord não é completamente desprovido de méritos. As cinemáticas são bem produzidas e o design de som é excelente, proporcionando uma experiência audiovisual de nível AAA. No entanto, a experiência global é comprometida por um esquema de preços que exige uma assinatura PlayStation Plus além do custo do jogo. Esta abordagem anti-consumidor, que obriga os jogadores a pagar mais para aceder a um jogo pelo qual já pagaram, deixa um sabor amargo.
Embora os visuais e o áudio do jogo mostrem sinais de uma curadoria cuidadosa e de um verdadeiro empenho, a jogabilidade e o design dos personagens parecem não justificar um período de desenvolvimento de oito anos. Para agravar a situação, o esquema de monetização é extremamente desfavorável para o consumidor, quer seja o facto de o jogo não ser free-to-play como outros do género, quer seja pela obrigação de ter uma subscrição do PlayStation Plus para o jogar, e ainda o facto de ter micro-transações, mesmo que seja só de cosméticos. É fazer com o jogo não só falhe em cativar, mas também colapsar no médio/longo prazo.
As semanas subsequentes poderão ajudar a elucidar-nos mais sobre isso, especialmente se forem adicionadas mais cinemáticas, adensando o interesse pelas personagens, criando uma maior proximidade a cada uma delas, para além de um match making mais sensato e um equilíbrio nas classes e personagens, como, em muitos dos jogos do género, acaba por acontecer. Concord não será um jogo para todos os jogadores, especialmente para aqueles que gostam de um lado mais frenético e caótico num FPS de heróis, mas para aqueles que procuram exactamente o contrário, poderá dar-lhes a curva de aprendizagem e o ritmo que sempre desejaram para gostarem do género. Concorde-se ou não é tudo uma questão de perspectiva.