Developer: Luminous Productions / Square Enix
Plataforma: PlayStation 5 e PC
Data de Lançamento: 21 de janeiro de 2023
Era provavelmente um dos jogos mais esperados deste ano, especialmente deste início de 2023 que poderá ser o da transição real para a nova geração, com muitos jogos a nem sequer serem editados na geração anterior. O trabalho da Luminous Productions, apelidado na sua concepção de Project Athia e depois como Forspoken, era a promessa de um jogo com um aspecto acima da média, tirando todo o potencial do Luminous Engine, que fez a sua estreia com Final Fantasy XV, mas será que nos arrebatou?
Devo dizer que a demo que foi lançada na PlayStation Store, cerca de duas semanas antes do lançamento, tinham-me deixado algo receoso. Como disse nesse artigo, que podem consultar no nosso site, o mapa parecia algo vazio, sem sentido e com poucas actividades, o que fazia com fosse algo enfadonho. Aliado ao facto de, nessa demo, estarmos bastante avançados no jogo, diria que depois das primeiras 3 horas, muita coisa fosse algo desconexa, o que fazia perder aquela relação que é comum num RPG, de exploração das personagens e da sua narrativa. A questão é: e agora tudo faz mais sentido e está mais bem conseguido?
A resposta não é fácil de dar, mas em termos gerais é Sim. Vou tentar explicar antes de aprofundar os vários pontos. Jogando agora a versão final, tudo ficou mais claro, a história apresenta-nos a personagem que vamos controlar e como é que foi parar a Athia, a ligação com a sua bracelete mágica, e o enquadramento do que aconteceu aos habitantes que sobreviveram a uma corrupção maligna e devastadora.
O mapa ganhou muitos mais pontos de interesse do que na demo, assim como muito mais propósito em cada uma das actividades disponíveis e a componente RPG está muito mais presente com o desenrolar das personagens centrais que vamos encontrar ao longo do jogo. No entanto, a forma como Forspoken liga todos estes elementos fica algo curto, com algumas opções estéticas difíceis de compreender, com um andamento bastante longo e demorado na acção inicial, e um sentido de repetição e de vazio em vários momentos.
A história do jogo começa com Frey em Nova Iorque a tentar dar um novo rumo à sua vida. A orfã é uma pequena delinquente que deve dinheiro a um grupo de criminosos e que está sempre metida em sarilhos e a cabo com a justiça. Aliás é só através do espírito natalício da época que Frey Holland se safa de ser presa, mas não se safou de ser perseguida por aqueles a quem deve dinheiro. Quando está prestes a fugir com o dinheiro que arrecadou em outros tantos delitos, Frey vê a casa que ocupou com o seu gato a ser incendiada e a ter que fugir pela vida. Sem rumo, deixa o seu gato à juíza que a safou e dá de caras com uma bracelete falante que apelida de Cuff que a teletransporta magicamente para o estranho mundo de Athia. De repente, a sua vida dá uma guinada surpreendente quando é imbuída de poderes mágicos e cercada por todos os lados por ruínas antigas e criaturas corrompidas.
Só que nem tudo está bem em Athia. Em outros tempos, os reinos eram governados pelas quatro Tantas – matriarcas benevolentes com poderes mágicos extraordinários. As Tantas usaram os seus dons para manter a paz e a prosperidade, mas ficaram distantes e cruéis quando uma corrupção insidiosa (também conhecida como “The Break”) varreu a terra e transformou todas as criaturas vivas em monstros.
Como Frey é, inexplicavelmente imune aos efeitos do Break, ela e Cuff conseguem chegar a Cipal, o último bastião da humanidade onde residem os cidadãos restantes de Athia. Assim que ela chega, uma série de eventos levam Frey numa aventura para os cantos mais distantes do mundo. Quer Frey goste ou não, ela é a única que pode restaurar a esperança para Athia e o seu povo. O jogo divide-se assim pelas seguintes áreas:
- Cipal – O último bastião da humanidade. Com a maior parte das suas terras natais cobertas pelo Break, pessoas de todas as quatro regiões de Athia agora vivem em Cipal, já que é o único lugar seguro que resta. Mesmo assim, ainda existe uma grande divisão entre ricos e pobres.
- Junoon: Famosa pelos seus artistas e curandeiros, Junoon é o reino de Cinta, a Tanta do Amor. O esplêndido castelo no coração de Junoon pode parecer tirado de um livro de histórias, mas um terrível dragão aterroriza esta terra outrora iluminada.
- Praenost: A enorme fortaleza militar da Tanta Sila fica em Praenost, de onde liderou os grandes exércitos de Athia quando não estava na linha de frente. O clima seco e o terreno rochoso tornam este território inóspito para viajantes despreparados.
- Avoalet: Justiça é a especialidade da Tanta Prav, e os seus veredictos nos tribunais de Avoalet eram infalíveis. No entanto, o seu julgamento vacilou conforme o Break avançava, e agora os majestosos salões de Avoalet e os belos canais estão cheios de perigo.
- Visoria: Como a Tanta da Sabedoria, Olas garantiu que a educação fosse uma prioridade em Visoria. As vastas planícies da região estavam repletas de escolas, mas à medida que o isolamento de Tanta Olas crescia, a liberdade de aprender dos seus súditos tornou-se menos importante do que a sua necessidade em controlá-los.
Como já devem ter adivinhado, o jogo vai basear-se em chegarmos a cada uma das Tantas e derrotá-las, se bem que há alguns “twists and turns” pelo meio. E para isso, vamos ter que percorrer o vasto mapa de cada região, com um vasto leque de Actividades opcionais, até chegarmos à luta final de cada região. Sim, não prima pela originalidade, eu sei, mas também não defrauda, aliás, as sequências envolvendo as Tantas são os pontos altos do jogo, e se calhar não foram tão explorados como deveriam ser. E passo a explicar.
Forspoken tem este problema de ser desproporcional em alguns aspectos. Se por um lado as secções de luta com as Tantas são dos momentos mais bem conseguidos, assim como as cutscenes envolventes, a chegada até essa luta já é bastante mais despojada e vazia. O lore existe, mas está praticamente todo alocado aos arquivos que vamos encontrando que nos relatam a história de Athia, das Tantas e de tudo o que aconteceu desde que apareceu The Break. Basicamente vamos estar a ler linhas de texto e mais texto para conhecer todos os factos, algo que facilmente poderia ser desbravado através de NPC’s, de diálogos mais extensos das Tantas, um maior número de cutscenes, como por exemplo, com Cuff a recuperar memórias de objectos ou arquivos e reproduzi-los para Frey, mas tal não acontece. Fica tudo emparedado nas leituras no menu perdendo o jogador de criar uma maior ligação com a história e as suas personagens.
Como tal acontece, o resto do jogo vai demonstrando esse sentido desproporcional no seu desenrolar, isto é, por entre todas as Actividades que temos ao longo do mapa de cada região, o andamento do jogo seria muito mais fluído e sem sentirmos que, por vezes, estamos num Endless Runner.
Devo dizer que as primeiras horas é onde se nota mais esta questão, não só porque estamos muito tempo dentro de Cipal, onde na parte mais rica não se consegue correr, sabe-se lá porquê, com pequenas Quests que passam por uma visita guiada à cidade ou a dar ervinha a ovelhas, que se torna só aborrecido e sem grande nexo. Mais nexo encontramos no andar atrás de gatinho para desvendar pequenos bonecos de madeira que nos permite trocar por atributos para a nossa vestimenta.
No entanto, Forspoken dá-nos um número bastante elevado de Actividades para fazer, as mais divertidas e interessantes fora de Cipal, isto é, no mapa de cada região afectada. Aí as habilidades do parkour mágico de Frey fazem as delícias dos fãs de Sonic Frontiers, aliás, as pequenas piscinas de mana a fazerem pequenos círculos no mapa parece quase uma pequena homenagem ao ouriço azul.
O mapa está recheado destas pequenas piscinas de mana, quase que a pedirem para serem apanhadas e a obrigar-nos a deslocar pelo mapa e em direcção às Actividades opcionais. Devo dizer que acho que isso até está muito bem conseguido, visto que quanto mais mana apanharmos, mais rapidamente podemos melhorar os atributos mágicos de Frey, e acreditem que vai valer a pena. Há algumas actividades bastante básicas como livrar uma área de inimigos, derrotar um mini-boss num tempo limitado ou abrir um cofre com um mini-puzzle embutido.
Há outras um pouco mais complexas, mas com maiores recompensas, normalmente um manto, um colar ou unhas, isto é, elementos de “armadura”. Essas são geralmente pequenas “Dungeons” em formato de labirinto onde temos que escolher portas até chegar a um Boss, enfrentando pequenas hordas de inimigos pelo caminho. Há ainda outras pequenas actividades como tirar fotografias de cada região, encontrar as grandes piscinas de mana que nos dão novas magias ou ainda pontos de interesse que revelam partes do mapa ou outros que nos dão melhores atributos à nossa personagem.
Apesar de toda a exploração possível, Forspoken é um jogo de acção onde as magias são a parte central da jogabilidade. Frey dispõe de um verdadeiro arsenal de magias de ataque e agentes passivos, são cerca de 100 feitiços que vamos ter ao dispor ao longo da jornada.
Os feitiços de ataque causam dano diretamente, enquanto os feitiços de suporte ativam vários efeitos passivos. Embora apenas um de cada tipo possa estar ativo ao mesmo tempo, podem segurar os botões L1 ou R1 a qualquer momento para retardar a ação e trocar um novo feitiço pelo slot ativo. A mecânica está muito afinada neste capítulo onde cada elemento, e serão 4 ao longo do jogo, traz 3 tipos de magias ofensivas e mais 4 tipos de magia auxiliares. Isso articulado com o facto de cada inimigo ser propenso a determinado tipo de elemento, faz com que exista algum sentido de estratégia, sem perder o ritmo elevado da acção misturada com parkour para nos desviarmos dos ataques adversários e com aquele medidor à Devil May Cry que nos vai indicando a nota da nossa execução “artística”.
A câmara nem sempre ajuda e o Target Lock não reage tão suavemente como desejado, mas é verdadeiramente divertido encaixar todo o tipo de ataques à velocidade da luz, trocando magias de forma super intuitiva e com grafismos de grande qualidade neste capítulo. Os efeitos de partículas das magias, dos vários elementos, até dos vários adversários, são o ponto maior do jogo, onde parece que entra num mundo à parte e nos dá a sensação que Forspoken poderia e deveria estar talhado para outros voos.
Dito isto, não posso dizer que não me tenha divertido a jogar Forspoken. O início mais lento dos primeiros 6 capítulos pode dificultar um pouco a experiência, mas como tenho a mania de “varrer” o mapa, fui sempre encontrando actividades e testando as minhas novas habilidades ao longo dessas primeiras 8 horas, mas os restantes 6 capítulos e com direito a dois finais, tiveram um andamento muito mais acesso, que, aliado ao facto de passarmos a ter novos elementos à disposição e até novas formas de nos locomovermos, deram uma pica extra. Se forem sempre a direito na história vão ter cerca de umas 14 horas, mas se fizerem todas as actividades, facilmente vão andar mais perto das 25 horas, isto se quiserem platinar.
Outro dos aspectos que me deixou confuso foi a componente gráfica. Como leram, eu achei que a parte das magias, dos feitiços, das habilidades, com uma execução muito boa, diria até que em momentos excepcional, mas depois o mundo em si e as cutsecenes variam drasticamente. Os NPC’s que não são interpretados por actores, são francamente mal executados, muito repetidos, as texturas de elementos à sombra perdem a definição quase por completo, a iluminação não está muito bem conseguida, para além de nunca ser de noite, seja lá quantas horas passarem no mesmo sítio. As cutsecnes, nomeadamente as na cidade de Nova Iorque também deixam a desejar, melhorando substancialmente a partir da segunda metade do jogo, sabe-se lá porquê.
Por outro lado o uso do DualSense está muito bem conseguido, conseguimos sentir o terreno que Frey pisa com o feedback háptico, as magias também podem ser aplicadas com vários tipos de aperto dos gatilhos hápticos, para além de Cuff falar através da pequena coluna do comando.
Forspoken tinha tanta magia para espalhar, mas o feitiço virou-se contra o feiticeiro. É um facto que a jogabilidade pura e dura do parkour mágico e de combate são muito boas, chegam até a ser mesmo singulares em termos de fluidez e de oferta daquilo que podemos executar com a nossa personagem. É um facto também que o mapa está recheado de actividades para nos perdermos em longas horas a tentatr desbloquear tudo e mais alguma coisa e a dominar todos os feitiços disponíveis.
No entanto, é também um facto que em termos gerais graficamente foi um tiro ao lado, onde apenas a componente de combate é realmente eficaz e de outro nível comparado a tudo o resto. Para além disso, as decisões técnicas das pequenas cutscenes com efeitos de transição de fade to black, os efeitos de iluminação e as descrepâncias nas texturas e nos NPC’s, sugam a vicacidade e adrenalina que o jogo nos podia oferecer. Assim como a narrativa é bastante interessante, com dois finais e a profundidade das personagens até está lá, só que metida num menu de arquivo para lermos, quando deveria estar inserido na dinâmica de jogo. É uma pena porque o potencial estava todo lá.