Developer: Super Spin Digital
Plataforma: PS5, PS4, Xbox One, Xbox Series S|X e PC
Data de Lançamento: 09 de julho de 2024

Nos tempos de hoje é difícil encontrar jogos que nos tragam algo de novo e de nunca visto até então, por isso mesmo, esta proposta, curiosamente da Capcom, que costuma seguir a tradição das suas franquias, é uma verdadeira lufada de ar fresco.

Kunitsu-Gami: Path of the Goddess é um jogo totalmente novo dos developers da Capcom, combinando géneros como ação, hack n’ slash, estratégia, tower defense, RTS e muito mais para criar o seu próprio género distinto: Estratégia de Ação Kagura.

No jogo vamos testemunhar um confronto épico entre o reino espiritual e o homem mortal, enquanto os aldeões do Monte Kafuku lutam para purificar a montanha sagrada em que vivem. Criaturas repugnantes chamadas Seethe cercaram esta montanha, atraída pela contaminação que se espalhou pelas aldeias. Para purificar a terra e selar os Seethe noutra dimensão, a Deusa Yoshiro tem que realizar um rito de limpeza, sendo que precisa de um guia para criar o caminho para ela, ao mesmo tempo que derrota essas criaturas para que Yoshiro faça o ritual.

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Em Kunitsu-Gami, o jogador tem a tarefa de guiar a deusa Yoshiro através de um caminho contaminado pelo mal, protegendo-a simultaneamente de ataques de demónios chamados Coléricos. A responsabilidade recai sobre Soh, um guardião espiritual que combate os inimigos com a sua espada. No entanto, Soh não é o único guerreiro nesta jornada, e é aqui que começam as particularidades do jogo.

O jogo é composto por mais de 15 fases, excluindo os Bosses, e cada uma segue o mesmo formato. Soh e Yoshiro chegam a uma vila contaminada e começam os trabalhos para a recuperar. O objetivo é simples: limpar o caminho para que Yoshiro possa avançar e alcançar um portão Torii, passando assim para a fase seguinte. A caminhada da deusa é lenta, e é necessário acumular cristais para purificar a trilha. Durante o dia, Soh pode expurgar a contaminação em alguns elementos do cenário para acumular cristais, mas raramente são suficientes de imediato.

A jogabilidade segue um ciclo: durante o dia, acumular o máximo de cristais possível e, ainda mais importante, libertar cidadãos de “casulos” maléficos. Com os cristais, é possível transformá-los em guerreiros de várias classes, como arqueiro, lenhador e lanceiro. Também se pode empregar um carpinteiro para montar armadilhas e barreiras, preparando-se para a batalha noturna.

Quando a noite chega, começa a ação. Os portões abrem-se para os Seethe, que tentarão atingir Yoshiro a qualquer custo. Controlando Soh, posicionamos os cidadãos transformados em guerreiros para defender a deusa, como num jogo de estratégia, e também participamos ativamente nas batalhas, como num jogo de ação. Ao nascer do sol, os inimigos são queimados, e os cristais derrubados por eles podem ser usados para avançar ainda mais na trilha ou melhorar os atributos dos cidadãos-guerreiros.

Apesar de parecer esquisito, funciona. Cada cenário tem relevos e caminhos diferentes para os inimigos chegarem a Yoshiro, e raramente a força bruta é eficaz. É necessário gerir os recursos e posicionar as tropas da melhor forma para mantê-la segura. As especificidades de cada fase obrigam o jogador a agir de maneira diferente em cada uma delas. Às vezes, é mais fácil enfrentar os inimigos diretamente e deixar apenas os mais fracos para os lutadores; outras vezes, a massa de tropas é mais eficaz, e Soh tem de focar em perambular pelo cenário para curar, reposicionar e atribuir novas classes aos seus soldados — sem contar as fases em que Soh é obrigado a assistir de longe enquanto os cidadãos batalham sozinhos.

Tudo isto é potenciado por diferentes empunhaduras da espada do protagonista, que oferecem habilidades poderosas com longo tempo de recarga; há também bónus passivos equipados através de talismãs e uma progressão de habilidades que vale tanto para Soh quanto para cada classe. Todos têm uma tela separada para melhorar os seus talentos, mas não é exatamente uma árvore de habilidades — para as tropas, a progressão é sempre linear, e para Soh, é possível escolher qualquer upgrade numa “roda”, bastando ter recursos suficientes para os adquirir.

Além disso, após completar algumas fases, os jogadores enfrentam um Boss. Yoshiro fornece um número determinado de cristais para atribuir funções aos cidadãos que se juntam à luta, e ao entrar na arena, o jogador tem de descobrir as mecânicas de cada monstro. Algumas batalhas são simples e basta usar a força bruta, mas outras requerem bastante estratégia e podem até ser frustrantes. O que é mais interessante é a forma como o jogo mistura essas batalhas contra os Bosses, pois em algumas é um nível completamente pré-definido, mas mais lá para a frente, surgem por vezes embrulhadas nas fases dos ciclos dia-noite, surpreendendo. Para além disso, todos os Bosses têm uma mecânica própria, fazendo lembrar alguma batalhas de soulslike, em que é preciso usar uma estratégia própria e escolher bem as classes que nos acompanham.

Por fim, ao terminar cada fase, o jogo insere mais um género: o da gestão de uma “fazenda”. Cada cenário purificado precisa de reparações em construções danificadas pelos Seethe, e o jogador gere os cidadãos para realizar esses trabalhos. Não é nada muito complexo, mas fornece boas recompensas e é satisfatório ver as vilas a reerguerem-se.

Pode parecer muita coisa, e de certa forma é, mas tudo faz sentido. O jogo começa de forma simples e vai introduzindo novas mecânicas gradualmente para que o jogador se habitue a tudo. Nas minhas quase 20 horas de Kunitsu-Gami, não houve momentos em que me senti perdido ou sem saber o que fazer. No fim das contas, o ciclo básico de preparação durante o dia e batalha à noite rege todas as ações, e o que acontece dentro de cada fase vai ficando mais complexo a um ritmo fácil de acompanhar.

Graficamente o jogo é bastante peculiar, e isso deve-se ao facto de os developers terem usado uma abordagem pouco convencional na sua criação. Os objetos do jogo são primeiro criados como miniaturas da vida real que são depois digitalizados e transformados em modelos 3D.

Isto dá o jogo uma estética visual muito distinta. Para garantir a autenticidade, as roupas do jogo são criadas através das verdadeiras usadas na vida real, e, da mesma forma, digitalizadas em 3D para dentro do jogo. Todos os elementos do jogo, incluindo a configuração mundial, itens, UI e som estão focados no conceito japonês de Wa, uma referência à cultura do Japão. O jogo também inclui muitas referências à vida real e espiritual. O design dos Seethe e principalmente dos mini-bosses e Bosses é realmente extraordinário, fazendo-nos pensar na dimensão e particularidade de cada um deles, naqueles que já vimos em jogos soulslike.

Kunitsu-Gami: Path of the Goddess é uma proposta original que acaba por juntar vários géneros, a estratégia, a ação e a gestão, de forma surpreendente. Para jogadores como eu, que gosta de RTS’s, essa componente está muito bem conseguida com comandos simples, especialmente para usar com o comando, tem várias classes e várias abordagens possíveis, o mapa tem vários caminhos e estruturas que ajuda a aprofundar as nossas abordagens. Na componente de ação, o manuseio de Soh é bastante satisfatório, com vários ataques, habilidades, ao mesmo tempo que parece um hack n’ slash, acaba por agarrar mecânicas00 mais profundas com a possibilidade de defender, deflectir e esquivar, e por fim, a componente da gestão.  Aqui temos alguns puzzles de ambiente e faz-nos voltar constantemente aos vários aldeamentos para verificar a reconstrução de cada um deles, assim como as recompensas que farão toda a diferença no desenvolvimento de cada uma das classes e também das habilidades do próprio Soh. Parece muita coisa, mas acaba por ser muito simples, agradável e desafiante. É uma das grandes surpresas do ano.