Developer: Games Incubator, PlayWay, Ultimate Games
Plataforma: Xbox Series, PlayStation 5 e PC
Data de Lançamento: 2 de Fevereiro de 2025
Num mercado de videojogos saturado de experiências cada vez mais padronizadas, há jogos que surpreendem precisamente por irem noutra direcção — mais pequena, mais estranha, mais focada. Police Shootout, desenvolvido pelo estúdio polaco Games Incubator, é um desses casos. Em vez de apostar na adrenalina típica dos shooters ou no realismo absoluto de algumas simulações policiais, este título mistura géneros de forma inesperada: coloca-nos na pele de um agente da autoridade, mas com uma abordagem que combina investigação, escolhas morais, e até combates por turnos.
O resultado é um jogo que, mesmo com limitações técnicas visíveis, destaca-se pela originalidade das suas mecânicas e pela sinceridade com que tenta explorar o dia-a-dia de um polícia numa cidade fictícia marcada pelo crime. Apesar de claramente limitado em termos de orçamento, Police Shootout tem algo que muitos títulos maiores não conseguem replicar: identidade. É um projecto com alma, onde se sente o esforço de fazer diferente, mesmo que nem sempre tudo funcione na perfeição.
Lançado originalmente para PC em junho de 2022, Police Shootout foi recebendo actualizações e melhorias ao longo dos meses seguintes, expandindo gradualmente o seu conjunto de missões e polindo algumas das arestas mais visíveis. Só mais tarde, o jogo chegou finalmente às consolas, com versões disponíveis para Xbox Series X|S e PlayStation 5. Esta expansão para novas plataformas marca uma nova etapa para o jogo e para o próprio estúdio, que se tem especializado em simulações com temáticas muito específicas, como as franquias do Ship Graveyard Simulator e do Animal Shelter.
Apesar de a sua estrutura assentar em missões independentes e relativamente curtas, Police Shootout não abdica de uma tentativa de criar um fio narrativo contínuo — ainda que modesto — que dá algum contexto ao que se passa em cada operação. O jogador assume o papel de Scott Price, um agente recém-chegado ao departamento de polícia da cidade fictícia de San Adrino, uma metrópole mergulhada num clima constante de tensão e criminalidade. Embora o pano de fundo da cidade não seja explorado em grande profundidade, percebe-se rapidamente que se trata de um local problemático, onde o tráfico de droga, a violência doméstica, os assaltos e as ameaças de sequestro fazem parte da rotina diária das forças da autoridade.
A história de Scott é contada de forma subtil, por entre diálogos ocasionais, mensagens de rádio e pequenas pistas deixadas nas missões. Não há cutscenes elaboradas nem qualquer arco cinematográfico, mas sim uma acumulação de pequenas interacções e escolhas que ajudam a construir uma identidade para o protagonista. Scott é uma figura relativamente neutra no início, um espelho para o jogador. Mas à medida que as missões avançam e as decisões se acumulam, começamos a perceber nuances na sua postura.
Dependendo das abordagens escolhidas — mais agressivas ou mais conciliatórias —, Price pode ser moldado como um polícia pragmático e determinado ou como alguém disposto a escalar rapidamente para o uso da força, mesmo em situações delicadas. Cada missão funciona quase como um episódio autónomo dentro desta narrativa maior. Temos sempre um ponto de partida — uma chamada de emergência, um incidente em curso — e, a partir daí, cabe-nos reunir informação, falar com testemunhas, interpretar pistas e agir.
Há, no entanto, uma tentativa clara de criar continuidade narrativa através de personagens recorrentes, como certos suspeitos ou testemunhas que voltam a aparecer mais tarde, ou através de diálogos que referem eventos passados. Estas ligações, ainda que discretas, ajudam a dar ao mundo uma sensação de coerência e fazem com que as decisões anteriores tenham, pelo menos a nível atmosférico, algum peso. A narrativa de Police Shootout não tenta ser épica, mas sim funcional. Apoia-se no quotidiano, no gesto pequeno, no detalhe de uma conversa bem conduzida ou de uma pista bem interpretada.
Apesar deste esforço, é importante sublinhar que Police Shootout não aposta numa história complexa. Não há grandes reviravoltas nem revelações, e prefere ir pelo caminho de contextualizar a jogabilidade e dar-lhe alguma gravidade moral. Em muitas missões, a forma como lidamos com uma situação pode alterar ligeiramente o seu desfecho — por exemplo, um suspeito pode ser convencido a render-se se usarmos as informações certas obtidas através do diálogo e da investigação, enquanto a mesma situação pode provocar um tiroteio se formos descuidados ou excessivamente autoritários.
Esta relação entre narrativa e mecânicas é, de facto, um dos pontos mais interessantes do jogo. Police Shootout propõe uma leitura da realidade policial em que a informação e a comunicação têm tanto peso como a acção directa. O jogador é constantemente confrontado com a escolha entre usar a força ou tentar resolver as situações de forma mais pacífica, e mesmo que o jogo não penalize duramente o comportamento mais agressivo, deixa claro — através de pequenas reações dos NPCs ou da atmosfera geral — que cada abordagem tem consequências.
Há também um subtexto ligeiramente mais controverso, ainda que apenas esboçado, sobre os limites da autoridade e a tensão entre segurança e abuso de poder. Ao colocar o jogador em situações de decisão rápida, onde a linha entre o certo e o errado nem sempre é clara, o jogo levanta questões interessantes, mesmo que não as explore de forma profunda. Em certos momentos, Scott é deixado completamente sozinho para lidar com situações perigosas, como se o sistema o tivesse largado à própria sorte — o que pode ser lido como uma crítica subtil à forma como os agentes são muitas vezes colocados em contextos de alta responsabilidade sem o apoio necessário.
A jogabilidade de Police Shootout distingue-se por um conjunto de escolhas de design que misturam convenções de jogos de simulação com inesperados elementos de RPG táctico, oferecendo uma experiência singular no panorama dos simuladores policiais. O jogo apresenta-se como um híbrido entre investigação narrativa e combate por turnos, e embora a sua estrutura seja simples e de dimensão modesta, consegue surpreender pela forma como junta estas peças numa fórmula coerente e acessível.
São onze missões com aproximadamente 30 minutos de duração, e que ocorrem em espaços como motéis, garagens, armazéns e supermercados. Locais estes que funcionam como pequenos palcos para os mais variados cenários. A repetição dos ambientes é evidente, mas a diversidade nos objetivos e nas interações ajuda a mitigar a sensação de monotonia. Cada missão inicia-se geralmente com uma abordagem investigativa, onde temos de localizar testemunhas, conversar com civis, reunir pistas e cruzar informações fornecidas pela central de comunicações.
Este processo não é superficial: a informação obtida pode desbloquear opções de diálogo ou novas formas de abordar a situação, influenciando o desfecho do incidente. Há, portanto, um incentivo claro à observação e ao raciocínio lógico, ainda que o jogo mantenha tudo num registo simples e acessível. É uma tentativa tímida de criar ligações entre personagens e desenvolver um fio narrativo, mas a força do jogo reside sobretudo na sua estrutura episódica e no equilíbrio entre simplicidade e criatividade.
Quando as coisas escalam, o jogo entra no seu modo mais inesperado: o combate por turnos. Longe do caos tradicional dos shooters em primeira pessoa, Police Shootout adopta uma estrutura em que o jogador dispõe de pontos de acção para se mover, procurar cobertura, usar itens e atacar. Esta transição pode parecer desconcertante à primeira vista, mas acaba por introduzir uma vertente táctica interessante. Os tiroteios são breves, muitas vezes resolvidos em dois ou três turnos, e ocorrem após checkpoints automáticos, o que reduz a frustração em caso de falha.
O sistema de troca de tiros requer atenção ao tempo e ao alinhamento do cursor, criando uma espécie de minijogo de precisão em vez de depender exclusivamente da pontaria tradicional. As armas disponíveis evoluem com o tempo, incluindo uma espingarda e, mais tarde, uma arma de eletrochoque, ainda que, curiosamente, o jogador tenha acesso a armamento letal antes de ferramentas de contenção não letal. Não há penalizações por usar força excessiva, mesmo em situações delicadas — uma escolha que reforça a flexibilidade das abordagens, mas também levanta questões éticas que o jogo não se propõe a explorar.
A interface é funcional e intuitiva, com um menu radial que permite aceder rapidamente a objectos como lanternas, bastões ou algemas. Também a curva de aprendizagem é suave, e o tutorial inicial de cinco minutos é suficiente para familiarizar o jogador com as mecânicas essenciais. A progressão entre missões é directa, com classificações conforme o desempenho e pequenas melhorias que podem ser aplicadas a habilidades específicas. No entanto, este sistema de evolução é bastante básico e tem pouco impacto real na jogabilidade.
Apesar da sua natureza linear e curta — é possível terminar o jogo em três a quatro horas —, Police Shootout consegue manter o interesse através da variedade de microdesafios dentro de cada missão e da constante alternância entre momentos de investigação, diálogo e combate. Há uma tentativa tímida de criar ligações entre personagens e desenvolver uma linha narrativa, mas a força do jogo reside sobretudo na sua estrutura episódica e no equilíbrio entre simplicidade e criatividade.
Graficamente, Police Shootout deixa claro desde o início que se trata de um título de baixo orçamento, mas que, dentro das suas limitações, consegue cumprir de forma razoável. Os cenários onde decorrem as missões — desde motéis, armazéns, estações de serviço e complexos industriais — são pequenos em escala, mas detalhados o suficiente para suportar as mecânicas de investigação e de combate. Apesar da reutilização frequente de localizações — muitas missões partilham exatamente os mesmos espaços —, os ambientes têm o bastante de elementos interactivos para não parecerem completamente estáticos ou decorativos.
Os modelos das personagens são simples e, por vezes, repetitivos. Existem inconsistências visuais evidentes, como personagens cujo aspecto não corresponde à sua voz ou personalidade, o que pode causar alguma estranheza — por exemplo, uma figura com aparência frágil ou estereotipada que fala com voz agressiva e marcante. As animações também são limitadas, ocasionalmente rígidas, com movimentos que por vezes quebram a imersão. Ainda assim, é visualmente funcional, cumprindo o necessário para suportar a acção e as interações, sem grandes ambições estéticas.
No que diz respeito ao som, o resultado é misto. Os efeitos sonoros cumprem a sua função básica — tiros, passos, interacções com objectos — mas não têm grande presença ou impacto. O destaque vai para o trabalho vocal, que é surpreendentemente ambicioso para um jogo desta escala. Existe uma tentativa clara de dar personalidade às personagens através da voz, embora o resultado nem sempre seja consistente, sendo que esta dissonância entre visual e áudio pode ser desconcertante em certos momentos.
Police Shootout é um título modesto, mas ambicioso dentro do seu próprio desígnio. Apesar das limitações técnicas e estruturais, consegue destacar-se graças a uma proposta de jogabilidade invulgar, que mistura investigação, tomada de decisões morais e combates por turnos num contexto policial. Para quem procura algo diferente dentro do género dos simuladores policiais, esta é uma proposta com identidade própria — imperfeita, mas com mérito.