Developer: Teyon
Plataforma: PS5, Xbox Series S|X e PC
Data de Lançamento: 31 de Outubro de 2023
Será que ainda são do tempo do RoboCop?! Bem, eu levei um soco no estômago com o filme lançado em 1987, mas que só vi em 1992, já tinha oito anos. A realidade nua e crua de Detroit, que apesar de ser imaginada e passada no futuro, em 2028, não estava tão longe do que lhe aconteceu. Uma cidade pintada pela pobreza, pelo vício, pela marginalidade e pela polícia que, ou era corrupta, ou não tinha capacidade para impor a lei.
É assim que nasce RoboCop, uma experiência tecnológica de criar um robot polícia capaz de analisar todas as situações friamente, armado e blindado, capaz de superar todas as dificuldades que o mero homem não seria capaz. Mas, como sabemos pelo filme de 1987, a verdade é que as memórias de Alex Murphy, que foi assassinado numa rusga, não serviu apenas para “atar” os componentes electrónicos, mas dar-lhe também uma alma. É também nessa problemática que sempre vimos o antigo agente Murphy, a recordar a sua vida passada, a sua mulher e o seu filho, também eles assassinados, e tudo aquilo que perdeu, ao mesmo tempo que Anne Lewis, a sua parceira, também o vai tentando manter “humano”.
Para quem conhece pouco ou nada do filme, ou até da reinterpretação de José Padilha em 2014, estamos basicamente a falar de uma distopia de Detroit onde foi concedido à OCP – Omni Consumer Products o controlo do Departamento de Polícia de Detroit. E, como tal, a tecnológica decide criar um robot polícia capaz de fazer o que nenhum polícia humano conseguia, acabar com o crime.
Obviamente que aqui as analogias podem ser reinterpretadas à luz do tempo, a longíqua questão do Homem Vs Máquina, se um dia vamos ser controlados pelas máquinas, se os humanos vão ser obsoletos, ou se existe uma evolução gradual onde as máquinas serão veículos para a evolução do Homem, tendo em conta que o Homem será sempre superior à máquina porque é capaz de sentir, de amar, de ter uma alma. Hoje, esse debate poderia facilmente voltar à baila, tendo em conta, por exemplo, a questão da Inteligência Artificial.
Bom, deixemos essa questão de lado, por agora, para analisarmos o jogo RoboCop: Rogue City. Jogo cuja história está entre os filmes RoboCop 2 e 3, desenvolvido pela Teyon e com a edição da Nacon.
Uma coisa é certa, a equipa da Teyon era fã de RoboCop. É a melhor recriação deste universo: o ambiente escuro, decadente, as prostitutas, os drogados, os sem-abrigo, a polícia a fazer vista grossa a tudo e a não ter mãos para tantos crimes, e poucas pessoas decentes, que tentam apenas sobreviver. Aqui não há um pingo de riqueza, só “porcos, feios e maus”. É nessa escuridão apenas acentuada por alguns néons e as cores vívidas que assolam a mente dos viciados em Nuke, que surge a luz, isto é, o homem-lata, como tanta vez apelidado, reluzente e incorruptível. Para além dessa atmosfera gráfica, tão bem recriada, existe também toda uma reminiscência dos filmes através do HUD, doo mítico som do andar de RoboCop, da voz original com Peter Weller, e da banda sonora que acompanha o jogo. Sentimos efectivamente que estamos na pele de RoboCop, no filme e naquela Detroit.
Para nos sentirmos efectivamente o RoboCop, como seria de esperar, a sua movimentação e jogabilidade não poderia ser outra coisa senão dura que nem pedra. Sim, tínhamos que sentir que basicamente é um frigorífico a mexer-se a absorver balas e a disparar a sua arma automática a despedaçar corpos, e isso, está impecável, especialmente com o DualSense, pois sentimos mesmo o “peso” nos gatilhos hápticos e no feedback háptico.
Portanto, estamos a falar de um First Person Shooter, onde a opção de mirar activa a visão de Murphy com o rastreio dos inimigos no seu campo de visão, mesmo com objetos a obstruir e a marcá-los para os podermos vaporizar. Depois podemos agarrar em inimigos pelo pescoço e atirá-los pelo ar, rebentar com paredes ao murro ou atirar motas como se nada fosse. Também podemos apanhar outras armas pelo caminho, que vão desde a SMG’s, caçadeiras, passando por metralhadoras ultra-pesadas ou sniper rifles com balas de alto calibre. Como perceberam, aqui não há muita táctica ou técnica, é varrer tudo o que aparece pela frente, mas tenho que ter alguma habilidade na hora de mirar e disparar, porque, como devem calcular, a nossa vida não é infinita. Nesse campo vamos ter que ganhar vida com umas cápsulas da OCP ou então a recarregarmos a energia em caixas de electricidade.
Apesar desta jogabilidade muito “in your face”, a verdade é que a Teyon trouxe outros elementos RPG que colaram muito bem no formato, focando-se no trabalho de um verdadeiro polícia. Vamos ter diálogos e opções diversas para resolver os crimes, sejam investigando as áreas de crime, questionar testemunhas, juntar provas, defender cidadãos ou até passar multas de estacionamento.
Enquanto a ação se concentra mais nas missões/áreas destinadas diretamente para isso, nos locais maiores o jogo tende a ter um ritmo diferente e com outras opções. Enquanto que nas zonas de acção o trajecto é algo linear, dando apenas hipóteses a embarcarmos em missões secundárias por caminhos assinalados para o efeito, nas zonas maiores, podemos movermo-nos livremente e, conforme a missão com que nos deparamos, vai abrindo novos locais, como garagens, apartamentos, esconderijos, por aí fora. Nessas zonas há mais investigação, por assim dizer, mais pistas e contexto, quebrando assim o ritmo e dando maior variedade ao jogo. Ainda por cima, como algumas missões são desbloqueadas a passar por alguma zona ou a ouvir uma conversa, ou a encontrar algum objecto, acaba por ser bastante motivante.
Há mais uns quanto elementos de RPG que vamos percebendo com o decorrer das cerca de 20 horas de jogo, contando com múltiplas missões secundárias. Vamos ter uma árvore de habilidades para melhorar RoboCop, que se dividem em 8 pârametros:
- Combate: Com a possibilidade de recarregar as armas quando socamos os inimigos ou emitindo um choque elécrico.
- Armadura: Aumento o escudo, diminuindo o dano nas explosões e armas de alto calibre ou a armadura fazer ricochete de algumas balas.
- Vitalidade: Poder usar as caixas de electricidade para recuperar vida, ou no último nível fazer auto-regeneração
- Engenharia: Aumentado a velocidade do dash e os reflexos, ou ter a capacidade de rebentar cofres.
- Foco: Aumentando o tempo de slow motion nos momentos de arrombamento ou de relfexos, assim como a possibilidade de aumentar o dano crítico.
- Scanning: Poder usar superfícies para fazer ricochete nos inimigos, ou marcar todos os inimigos ao redor.
- Dedução: Conseguir combinações de cofres deduzindo o seu código, mais experiência ou marcar objectos valiosos no mapa.
- Psique: Sublinhar a melhor linha de diálogo, reduzir o impacto das escolhas ou ganhar mais pontos de popularidade com o povo.
Para além disso, existe ainda uma forma de progressão da nossa arma, a Auto-9, mas neste caso em forma de diagrama. Aqui teremos que colocar as peças certas, que parecem memórias ram antigas, com a forma certa para deslobquear os caminhos do diagrama que nos interessam. É uma espécie de puzzle, e uma forma diferente de abordar a questão, sendo que as peças têm uma percentagem que podem bonificar cada traço da arma, como recuo, dano, recarregamento ou capacidade.
Então, mas no que falha RoboCop: Rogue City, não há nenhum circuito queimado ou assim?! Há! E prende-se claramente com a falta de experiência da Teyon, que no seu catálogo e de género semelhante, tem apenas o Terminator Resistence. Mesmo usando o Unreal Engine 5, o trabalho gráfico varia entre o espantoso e o lamentável. Atenção, não é algo que estrague por completo a experiência do jogo, mas que salta à vista e até cria alguma estupefacção. Temos animações ainda grosseiras em certos momentos, efeitos de ecrã ou transição de cutscenes estranhas, qualidade duvidosa para alguns modelos de objetos e personagens, oscilação na taxa de quadros e polimento muito diversificado em termos dos NPC’s e personagens centrais.
Se de noite e na cidade de Detroit, a iluminação, os reflexos, as texturas estão bem conseguidas, os objectos e as divisões na esquadra da polícia estão muito bem detalhado; de dia e na sucateira que funciona como refúgio do gangue de motards Vultures, a iluminação deixa muito a desejar os objectos ficaram quadradões, e as estruturas ocas de detalhe. É pena, porque RoboCop está em toda a sua glória, bem modelado, com o reflexo do metal bem conseguido, a voz, o ambiente, som da sua Auto-9 e depois parece que caímos uma geração, graficamente falando.
RoboCop: Rogue City é feito de fãs e para fãs da saga. Diria que acertou no mais difícil, o ambiente, o feeling de sermos RoboCop e Alex Murphy, com uma mistura de FPS e RPG, mas ficou curto na componente técnica. É um bom jogo e será, sem dúvida, o melhor jogo feito até então, só merecia estar mais bem polido e modelado. No entanto, é obrigatório para os fãs.