Developer: SuperMassive Games, Behaviour Entertainment
Plataforma: Xbox Series, PlayStation 5 e PC
Data de Lançamento: 3 de Setembro de 2024
A Supermassive Games construiu uma reputação sólida no mundo dos jogos de terror narrativo, oferecendo experiências cinematográficas que envolvem decisões cruciais e consequências fatais, como exemplificado em clássicos como Until Dawn e a série The Dark Pictures Anthology. Com The Casting of Frank Stone, a estúdio uniu-se a uma publisher que tem igualmente o horror em comum, de maneira a aproveitar o lore de Dead by Daylight, o popular jogo multiplayer assimétrico da Behaviour Interactive.
A história de The Casting of Frank Stone explora as origens da misteriosa Entidade, a força sobrenatural que manipula os assassinos e sobreviventes no jogo original, expandindo a história de forma inédita. Para os veteranos de Dead by Daylight, a possibilidade de aprofundarem esse lado da narrativa é especialmente interessante, principalmente por introduzir uma nova perspectiva sobre Frank Stone.
Ao mesmo tempo, The Casting of Frank Stone tenta manter o charme e as características típicas dos jogos da Supermassive, como decisões que afectam o destino das personagens e ambientes atmosféricos que ampliam a tensão do jogador. Todavia, existem algumas diferenças para os outros títulos do estúdio, que poderá ser do agrado de uns, mas de estranhar para outros. O objectivo, é aproximar-nos ainda mais de um filme interactivo, dando um foco adicional aos diálogos e às cutscenes e cortando ligeiramente na exploração.
A narrativa de The Casting of Frank Stone desenrola-se em duas linhas temporais que se interligam de forma contínua, as quais vamos intercalando entre viver a história presente e conhecer o passado das personagens. Uma parte ocorre na década de 1980, em Cedar Hills, uma pequena cidade do estado de Oregon, onde um grupo de quatro adolescentes aspirantes a cineastas decide gravar um filme de terror de baixo orçamento chamado Murder Mill. O cenário para este filme é uma fábrica de aço abandonada, marcada por uma história sombria. Estes adolescentes acabam por se deparar com forças malignas ligadas ao assassino Frank Stone, uma figura que, mesmo distante no tempo, tem um impacto profundo nos eventos que se seguem.
A segunda linha temporal decorre nos dias atuais, no Reino Unido, numa mansão isolada onde três personagens – Madison, Linda e Bruno – são reunidos por uma anfitriã misteriosa, Augustine Lieber. O propósito do convite não podia ser mais intrigante, dado que têm uma proposta para vender as partes que possuem de Murder Mill, o filme dos anos 80 que foi dividido em várias peças após sua produção. Esta reunião, porém, rapidamente toma um rumo mais sinistro, quando as personagens percebem que estão envolvidas numa trama mais complexa e perigosa do que inicialmente acreditavam.
O ponto de ligação entre estes dois lugares no tempo é Frank Stone, o serial killer da década de 80 cujas acções têm repercussões directas nas vidas das personagens. A sua ligação à Entidade, uma presença sobrenatural já conhecida pelos fãs de Dead by Daylight, vai sendo lentamente revelada à medida que os jogadores avançam na história. A Entidade é a fonte de poder que controla Frank Stone, e ela mesma é o elo que liga The Casting of Frank Stone ao universo maior de Dead by Daylight. É através dela que a narrativa tenta amarrar os eventos das duas épocas, criando uma atmosfera de constante tensão e mistério.
Apesar desta forte ligação ao universo de Dead by Daylight, The Casting of Frank Stone não usa muitas das personagens ou vilões do título principal. Embora existam referências e easter eggs que os fãs certamente vão reconhecer – como objetos relacionados com assassinos famosos do jogo, ou a mecânica de reparação de geradores –, a história foca-se em personagens e eventos originais. A ideia de amplificar o lore através de uma história focada em Frank Stone e na Entidade faz sentido, já que nos ajuda a conhecer em pormenor todo o contexto que envolve a personagem. A narrativa procura levar-nos até às profundezas do mal que a Entidade representa e os seus terríveis tentáculos, sendo uma oportunidade de mostrar um lado mais cavado da mitologia do jogo, embora não seja vital para compreender o jogo original.
Quando comparamos com outros títulos da SuperMassive, o ritmo de The Casting of Frank Stone é claramente mais lento. Pessoalmente, gosto. É preferível uma história que demore a desenvolver, mas que seja coerente, a uma que apresse os acontecimentos e acabe por ser menos lógica. Não só permite uma construção de suspense muito mais sólida, como a tensão vai acumula gradualmente, criando um ambiente de constante apreensão.
Sem a pressão de uma ação ininterrupta, o jogador é incentivado a prestar mais atenção aos detalhes, absorvendo de forma mais profunda os cenários e a atmosfera que cercam a narrativa. Cada momento de silêncio intensifica a expectativa, preparando o terreno para os momentos de terror de forma muito mais eficaz. O jogo tem a oportunidade de explorar melhor suas personagens, desenvolvendo-as de forma mais complexa, sobretudo nas relações entre si.
E isto é algo particularmente importante numa história como a de The Casting of Frank Stone, que envolve mais do que uma linha temporal. O jogador tem mais tempo para assimilar os eventos, reflectir sobre as consequências das suas escolhas, e conectar-se emocionalmente com os personagens, algo que seria mais difícil de alcançar em uma narrativa mais acelerada. Deste modo, a tensão psicológica de cada nova revelação tem um peso maior, e deixa-nos mais atentos aos pormenores.
A jogabilidade de The Casting of Frank Stone partilha várias das mecânicas de outros títulos da Supermassive Games, mas também apresenta pequenas diferenças que o distinguem. Como de costume, o jogo é uma mistura de sequências narrativas dependentes de escolhas e quicktime events, com um forte foco nas consequências das decisões tomadas. Este sistema de múltiplas escolhas e diversos desfechos possíveis é um dos pilares da Supermassive, e está também presente em The Casting of Frank Stone.
Ainda assim, há algumas diferenças nas mecânicas de jogabilidade que o diferenciam dos seus antecessores. Uma delas é a introdução de um componente de combate que, embora limitado, oferece um toque novo. Durante algumas sequências de exploração, o jogador utiliza uma câmara Super 8 para combater entidades sobrenaturais. Este novo elemento adiciona uma mecânica inédita em jogos da Supermassive, onde o jogador raramente se via diretamente envolvido em confrontos.
Esta câmara, ao ser usada como uma arma, permite que o jogador grave as criaturas de forma a enfraquecê-las, o que traz uma dinâmica interessante, ainda que não seja tão intensa quanto combates mais tradicionais de outros jogos de terror. Essa nova mecânica de combate, apesar de original e relativamente simples, representa uma tentativa da Supermassive de diversificar as interações durante o jogo e testar novos caminhos para as obras futuras.
Outra diferença está na exploração dos cenários. Em The Casting of Frank Stone, há um foco maior em resolver pequenos puzzles, como mover objectos para desbloquear áreas ou encontrar chaves para abrir portas. Estes puzzles não são propriamente difíceis, mas são mais frequentes do que em títulos anteriores, que costumavam ser mais lineares em termos de exploração. Podem contar com algum backtracking, mas é uma abordagem funciona bem, e faz com que o jogador interaja um pouco mais com o cenário, contribuindo para a imersão que é sempre importante em jogos de terror.
Entretanto, uma das críticas que pode ser feita às mecânicas de The Casting of Frank Stone é que os quick-time events, que são um elemento central na jogabilidade da Supermassive, podem parecer um pouco repetitivos, e, ocasionalmente, até injustos e pouco condizentes com os níveis de dificuldade. Por outro lado, o perigo não é um factor tão constante como aquilo que tínhamos nos jogos anteriores, e embora uma exploração mais livre seja um passo na direcção certa, fica a sensação de que a jogabilidade poderia ser mais dinâmica.
Não obstante, para quem é colecionador, e em particular conhecedor do universo de Dead by Daylight, tem aqui muito com o que se entreter. Há muitos collectibles escondidos, ambos relacionados com o lore do jogo da Behaviour Interactive, e dividem-se em dois grupos: as Trinkets e as Relliks. Estes objectos podem ser encontrados em locais específicos ao longo das diferentes linhas temporais, incentivando uma investigação minuciosa tanto da mansão, como da fábrica abandonada. Fazem frequentemente referência a personagens ou eventos passados do lore de Dead by Daylight, o que proporciona um vínculo extra para os fãs mais dedicados da franchise.
Há ainda a novidade do Cutting Room Floor que oferece uma maneira interessante e estratégica de revisitar e experimentar diferentes decisões sem que tenhamos de recomeçar o jogo. Podemos retornar a momentos específicos dentro dos capítulos já jogados, explorar escolhas alternativas e ver como estas podem alterar o destino das personagens, especialmente em situações de Quick Time Events ou quando decisões narrativas críticas foram feitas. Esta funcionalidade facilita a descoberta de caminhos opostos aos inicialmente tomados, algo que pode ser particularmente útil para descobrir os mais de dez finais disponíveis.
Outro aspecto importante é que o Cutting Room Floor também apresenta percentagens globais de escolhas, mostrando quão populares ou raras foram certas decisões entre todos os jogadores. Há também ícones que indicam quando a morte de uma personagem é garantida naquele segmento da história, oferecendo uma visão antecipada dos resultados mais drásticos. É uma mecânica que redefine a forma como a Supermassive Games lida com a narrativa interactiva, proporcionando ao jogador uma maneira mais controlada de rever e moldar os acontecimentos, ao mesmo tempo em que enriquece a experiência com a possibilidade de explorar finais e ramificações não lineares.
Ao contrário dos outros jogos da Supermassive Games, não há um modo multiplayer online tradicional. No entanto, manteve a sua assinatura de experiência cooperativa através do modo couch co-op, permitindo que várias pessoas joguem juntas no mesmo espaço físico, semelhante ao que já fizeram noutros títulos, como em The Dark Pictures Anthology. Neste tipo de modo, os jogadores podem passar o comando entre si durante as decisões narrativas, e cada jogador pode controlar diferentes personagens em momentos-chave da história, aumentando a imersão e a dinâmica colaborativa.
O formato de múltiplos finais e de escolhas ramificadas encaixa-se bem com essa modalidade de jogo em grupo, pois incentiva discussões sobre qual a direcção a narrativa a ser tomada e quem deve sobreviver. Isso, juntamente com o recurso de revisitar partes anteriores do jogo para explorar caminhos diferentes no “Cutting Room Floor”, torna o couch co-op uma experiência bastante envolvente, proporcionando diferentes sessões de jogo que podem divergir radicalmente umas das outras dependendo de quem está no controlo.
Em The Casting of Frank Stone, a Supermassive Games continua o padrão de qualidade gráfica que já é esperado dos seus títulos, oferecendo uma experiência visual impressionante, ainda que com algumas limitações em termos de inovação. Os cenários são meticulosamente detalhados, tanto nas sequências do passado como nas cenas que se passam no presente, com ambientes que transmitem uma atmosfera claustrofóbica e pesada. O aço enferrujado e a escuridão industrial de Cedar Rapids contrastam bem com a opulência decadente da mansão Gerant Manor, criando uma dualidade visual interessante que sustenta a narrativa do jogo.
Os modelos das personagens e as animações faciais são pontos altos do jogo, como tem sido habitual nas produções da Supermassive. A captura de movimentos e as expressões faciais são realistas, proporcionando maior imersão nos diálogos e nas escolhas de momentos dramáticos. No entanto, em algumas ocasiões, pode haver uma leve inconsistência na qualidade das animações, o que resulta em expressões faciais um pouco robóticas ou movimentos que não fluem tão bem em determinadas cenas. Isso, apesar de não ser um problema enorme, pode tirar um pouco do impacto emocional de certos momentos.
Os efeitos de iluminação e de sombra são particularmente importantes na construção de suspense e medo, e The Casting of Frank Stone utiliza-os eficazmente. A escuridão sempre parece estar à espreita, e as luzes suaves de lanternas ou o brilho fraco da Super 8 cam acrescentam à tensão. São efeitos fundamentais para criar uma atmosfera de terror psicológico e também destacam os momentos de acção, como quando o jogador enfrenta inimigos sobrenaturais ao usar a câmara.
O design de som é um dos elementos que mais contribui para a atmosfera tensa e de horror. Desde os efeitos sonoros que pontuam os momentos de maior suspense até à banda sonora inquietante, o áudio desempenha um papel basilar na construção da experiência de terror. Pequenos detalhes, como o som do vento assobiando em corredores abandonados ou o ranger de portas enferrujadas, ajudam a criar um ambiente denso e ameaçador, mantendo o jogador constantemente em alerta.
O voice acting é um dos pontos altos do jogo e merece destaque. O elenco principal entrega performances convincentes, trazendo profundidade emocional às personagens e tornando as interacções mais credíveis. A entrega durante momentos críticos, como decisões de vida ou de morte, é feita com intensidade e realismo, o que reforça a sensação de pânico e impacto das escolhas que o jogador precisa de fazer. Pode parecer secundário, mas é algo que leva o jogador a importar-se com o destino de cada personagem, o que é essencial numa estrutura narrativa focada em escolhas e consequências.
The Casting of Frank Stone é uma expansão interessante do lore de Dead by Daylight, trazendo uma perspectiva alternativa do que até agora era conhecido deste universo. Embora não seja uma inovação dentro dos jogos da SuperMassive, consegue oferecer uma direcção ligeiramente diferente dos outros títulos do estúdio, mas igualmente imperdível.