Developer: All Possible Futures
Plataforma: PlayStation 5, Xbox Series S|X, Nintendo Switch e PC
Data de Lançamento: 17 de outubro de 2024
Eu sei que vai parecer estranho o que vou dizer, mas é verdade: numa altura em que vemos uma subversão da realidade, especialmente nos jogos desportivos, na transformação da simplicidade e da pura diversão para o extremamente competitivo, sabe bem, quando nos chega às mãos um jogo que nos faz recordar porque é que gostamos tanto de videojogos.
The Plucky Squire é a representação disso, pega numa ideia relativamente simples, a de vivermos com a nossa personagem dentro de um livro de fantasia, numa aventura para salvar o reino de Mojo, mas ao mesmo tempo para salvar o futuro do pequeno Sam, um rapaz que, através deste pequeno livro poderá inspirar-se a ser ilustrador e criar os seus próprios universos.
Como já perceberam a acção acaba por acontecer em dois planos, o plano físico, real, do quarto do pequeno Sam e, o mundo da ficção do livro que tem Jot como o seu herói principal. E o que é que distingue este jogo de outro qualquer seja em formato 3D ou 2D? É que este junta os dois formatos, com Jot a ser capaz de entrar e sair do livro, andar pela secretária, entrar em post-its, canecas, a escalar brinquedos, castelos, prateleiras e por aí fora. O que o jogo acaba por nos dar são infinitas possibilidades de criar e brincar, assim como nos vai desafiar a pensar fora da caixa e imaginar o que pudemos fazer. E agora pergunto: Não era isso que fazíamos quando éramos miúdos? Não imaginávamos cenários para os nossos brinquedos, as caixas não se tornavam edifícios? A massa esparguete não se tornava lanças para serem atiradas?
O jogo consegue ir buscar esses sentimentos mais nostálgicos, mas que precisam tanto de ser recordados às novas gerações que vivem agarradas, desde cedo, a todo o tipo de dispositivos. Pelo menos nas consolas e PC, podem jogar esta proposta do pequeno estúdio britânico, All Possibles Futures, e ficar com esta ideia de que o mundo ainda pode ser o que quisermos fazer dele, e que nos podemos divertir usando a nossa imaginação.
Não se faz um bom livro sem uma boa história e, neste caso, na versão original do livro, The Plucky Squire, Jot e os seus amigos vão andar pelos vários recantos de Mojo para tentar derrotar as tropas do feiticeiro mauzão Humgrump. Só que este malvado feiticeiro arranjou uma forma de conseguir reescrever o livro, e, desta forma, vencer e subjugar todos os habitantes de Artia e de todos os outros recantos de Mojo.
Nota-se que o estúdio foi fundado por dois antigos programadores da Nintendo, tanto na imagética, com na cor e no tipo de puzzles, assim como na sua estrutura de plataformas e, já agora de ideias fora da caixa. A verdade é que durante as minhas 7 horas de jogo, acho que tem a duração ideal, foi sempre surpreendido, até no enredo.
Vamos tentar ir por partes, se bem que, em determinado momento as mecânicas cruzam-se. No ambiente 2D temos um jogo que varia entre o tradicional plataformas e puzzles de ambiente. A visão é numa espécie de side-scroller, onde vamos percorrendo as folhas do livro de uma ponta à outra, sendo que a forma como as percorremos quer na sua verticalidade, quer na disposição do livro vai alterar a nossa navegação.
Combinando exploração, plataformas e puzzles, Jot tem de enfrentar constantemente um exército de criaturas comandadas pelo Humgrump, tanto dentro quanto fora do livro. Com uma espada que se assemelha à ponta de uma caneta de tinta permanente, Jot possui um conjunto de habilidades, como o ataque directo ou básico contra os inimigos. No entanto, mais habilidades podem ser adquiridas ao longo da aventura. O ataque com salto, o arremesso da espada e o ataque em forma de parafuso são exemplos de técnicas que podem ser desbloqueadas. Isto permite ao herói usar diferentes abordagens para alcançar o sucesso. Estes upgrades são obtidos ao trocar pequenas lâmpadas que podem ser encontradas em arbustos, árvores ou derrotando inimigos.
No entanto vai precisar de muito mais do que isso, vai precisar usar a sua intuição e inteligência para desvendar os vários puzzles que vai encontrar. Se, de vez em quando, é só puxar determinado objecto para cima de determinado botão, activando um mecanismo, há muitos outros que vão precisar puxar pela imaginação para descobrir a solução. Desde fazer saltar palavras das legendas e trocar umas por outras, transformar água em gelo ao trocar palavras do contexto, saltar fora do livro para trocar de página, usar carimbos nas páginas para detonar tanques dentro do livro ou parar mecanismos, ou até mesmo inclinar o livro para um lado ou para o outro para fazer objectos moverem-se dentro do mesmo. E quanto mais avançado forem na vossa aventura mais terão que pensar em todas as possibilidades para chegar à solução de cada puzzle.
O andamento do jogo foi bastante bem estudado, porque depois de familiarizados com as mecânicas, poderia parecer algo repetitivo, mas tanto a acção, muitas vezes transformada em acção furtiva fora do livro, como os mini-jogos que encontramos, nos bosses, mas também em situações muito específicas, levam-nos a nunca achar o jogo entediante. Cada um dos Bosses que encontramos nestes 10 capítulos do jogo e do livro, vão ter mini-jogos definidos. Vamos ter um mini-jogo de boxe, como um bom Fight Night, um de ritmo sonoro, um de disparar flechas nos inimigos, uma espécie de Puzzle Bubble e um clássico shooter com jota com uma espingarda laser e um jetpack.
E se os Bosses têm estes mini-jogos associados, há mais variedade também nos níveis em si, onde até vamos fugir de um T-Rex em versão side-scroller, assim como um shooter, e vários tipos de plataformas. É engraçado como vamos conhecendo o quarto de Sam a cada capítulo, explorando e vivendo as suas brincadeiras, as pontes feitas com réguas, a carta de Magic de Gathering a fazer de guarda de uma torre, os desenhos pintados em caixas.
Jot nunca estará sozinho nesta viagem entre mundos. Há post-its onde Page, uma minhoca dos livros, indica um objetivo a cumprir. Trash e Violet são outros companheiros, cada um com habilidades específicas, como a percussão e a pintura. Por isso, os diálogos são frequentes e há sempre personagens com quem é necessário interagir e trocar algumas palavras. No entanto, com os inimigos, essa interação nem sempre corre bem, acabando frequentemente em confronto. Destaque ainda para o feiticeiro que está do nosso lado Moonbeard que até certo ponto nos faz lembrar o Gandalf, que tem um pequeno ajudante que nos dá dicas sobre os puzzles, para além de mandar umas quantas piadas.
Para aqueles que quiserem, o jogo está traduzido em português do Brasil, assim como dobrado para a mesma língua, sendo que nesse caso, os mais pequenos que estiverem habituados a ver os filmes da Disney em brasileiro, certamente vão reconhecer a voz do narrador, Mauro Ramos, actor que emprestou a sua voz às personagens Pumba, Shrek, entre outros.
The Plucky Squire é, sem dúvida, candidato a jogo indie do ano. A proposta criativa aliada a mecânicas simples, mas sempre surpreendentes, torna-o especial. Para os veteranos dos videojogos é uma história reconfortante que nos lembra porque gostamos de jogar: com uma atmosfera sempre positiva, o jogo atravessa diversos géneros e presta homenagem a clássicos consagrados, mantendo um ritmo envolvente e sem perder a sua própria essência. Por outro lado, o jogo pode também ser uma excelente porta de entrada, será um excelente jogo para jogar entre pais e filhos, até porque a aventura de Jot está repleta de lições valiosas que podem servir de inspiração tanto para crianças como para adultos.