Mais sangue! Mais vísceras! É assim que imaginamos Shinji Mikami a gritar com a equipa de The Evil Within, lead designer do título, responsável pela brilhante série Resident Evil e por várias reinvenções do género survival horror. Mas no caso de The Evil Within mais foi claramente menos. Comecemos pelo início.

Um homicídio em massa acontece num hospital psiquiátrico, e o detective Sebastian Castellanos e os seus colegas são chamados ao local do crime. Ao chegarem deparam-se com vários corpos espalhados pelo chão e, como seria de esperar, tudo começa a correr mal. Pouco depois Sebastian dá por si pendurado pelos pés rodeado de corpos e assim se inicia a nossa descida ao inferno.

Efectivamente os problemas do jogo surgem logo ao início, ao falhar na criação de qualquer tipo de tensão. Esqueçam o início de jogos como o primeiro Resident Evil ou mesmo o Resident Evil 4, onde Shinji conseguia criar logo à partida um ambiente necessário a um jogo de Survival Horror. Aqui, mal abrimos a porta do hospital, qualquer tipo de tensão desvanece-se. É tudo gratuito. Corpos pelo chão, sangue por todo o lado, sem qualquer tentativa de criar suspense ou mistério.

 

Ao escaparmos ao que aparentava ser o fim para o nosso Sebastian, começamos no já habitual tutorial. Sangue e vísceras pintam a parede e o chão onde nos encontramos. Ao fundo um homem de cutelo na mão mutila corpos em cima de uma mesa. A ideia parece ser evitá-lo e escondermo-nos nos vários cacifos dispersos pelo cenário, claramente inspirado por jogos como Amnesia: The Dark Descent ou Outlast. Dois jogos incríveis, e não colocaríamos objecções caso The Evil Within seguisse por esse caminho. Infelizmente, o jogo quase que nunca volta a tocar nesta mecânica. É como que Shinji tivesse decidido: “OK, mecânica de Outlast já está feita, agora fazemos stealth“. E de seguida mostra-nos como matar inimigos sorrateiramente, no entanto e mais uma vez, esta segunda mecânica raramente será usada durante o jogo.

A partir daqui a história começa a desenvolver-se aos poucos, introduzindo pedaços de história quando lhe apetece, mas sempre com pouco interesse. Será isto realidade ou apenas a minha imaginação? São alguns dos temas mais do que clichés neste tipo de jogos e marcam também a sua presença aqui. Passamos de um cenário para outro com direito a algumas cutscenes e de um jogo para outro. De Silent Hill passamos para Resident Evil 4 (inspirando-se até na vila inicial deste jogo no terceiro capítulo) e daí para uma qualquer inspiração retirada de vários jogos do género. E isto mesmo assim, poderia ser algo bom. Uma colectânea com o melhor que estes jogos têm para oferecer. Infelizmente não o consegue, e um dos maiores culpados é a nossa personagem principal, Sebastian, que se move como uma mula. É lento, pesado e incapaz de correr durante alguns segundos sem parar para apanhar ar. O que mais uma vez faria sentido se isto fosse um jogo onde stealth fosse o ponto principal. Mas não o é. Quando o jogo decide que é tempo de jogarmos um pouco de Resident Evil 4, Sebastian claramente não tem a agilidade de Leon. E além do problema de asma já referido, pouco sabe de combate corpo a corpo e muito menos consegue disparar em várias direções rapidamente. Sendo assim, é óbvio que o sistema de combate não nos satisfaz, sentimo-nos completamente desconectados do que tentamos fazer no jogo e isso faz com que cada interacção com os vários inimigos se torne em pura frustração.

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Nem os upgrades que podemos fazer gastando um gel verde que vamos apanhando pelos cenários consegue transformar Sebastian em alguém mais atlético. E não é que os inimigos que enfrentamos sejam zombies lentos e estúpidos. Os vários monstros servem-se de armas, pistolas, snipers e até metralhadoras para nos matar. E acreditem que o jogo não é fácil. Morremos vezes sem conta, mas quase nunca sentimos que a culpa é nossa. Ou a câmara é tapada por uma parede ou então existe uma acção que simplesmente não é efectuada quando pressionamos a tecla correspondente. E é este ciclo de morrer, voltar ao combate e morrer, que acaba por destruir qualquer tipo de medo que poderíamos sentir. Deixando de ser desafiante para ser simplesmente repetitivo e frustrante. O único medo com que ficamos do jogo é de sermos mortos instantaneamente por uma armadilha que nem vimos e ter que repetir tudo desde do save feito à dez minutos atrás.

Mas nem tudo é mau em The Evil Within. Há realmente bons momentos no jogo, onde o título nos deixa utilizar as várias mecânicas, seja a usar armadilhas pertencentes ao local onde estamos ou a usar as nossas armas de maneira inventiva. Geralmente em espaços abertos onde conseguimos planear o que pretendemos fazer. Mas com muita pena nossa, isto não acontece vezes suficientes. Preferiríamos jogar estes cenários durante o jogo todo, invés de meia dúzia deles espalhados pelo título.

 

Graficamente, o título é inconsistente. Felizmente, na versão PC (na qual jogámos), e graças ao patch lançado entretanto, já é possível jogar a 60fps e sem Letterbox, o que melhora consideravelmente a experiência. Mas não há bela sem senão. O modo arranjado para retirar a Letterbox foi simplesmente fazer zoom à imagem. Ficamos então com Sebastian a ocupar metade do ecrã. Felizmente a internet existe e, rapidamente, encontramos uma solução para alterar a câmara de maneira a controlar a personagem a uma distância adequada. Mas isto não deveria ser necessário e não nos parece complicado incluir um slider para o Field of View. Os efeitos de luz conseguem ser maravilhosos mas acabam por contrastar com os modelos geométricos usados em objectos, carros e personagens, que conseguem ser bastante pobres. E mesmo as texturas de baixa resolução, que em espaços abertos conseguem parecer satisfatórias, deixam de o ser quando a acção é passada dentro de quatro paredes e se torna impossível de esconder o quão pobre são. A forma que os developers encontraram para esconder estas imperfeições e tornar o jogo mais coeso graficamente foi a implementação de um filtro de grão, que acaba por ser mesmo assim, insuficiente.

Pode-se dizer que The Evil Within é como uma colectânea de vários jogos de Survival Horror, inimigos “inspirados” por outras séries e mecânicas de títulos anteriores de Shiji Mikami. Elementos forçados a conviver num só jogo, velhas ideias reformuladas e coladas umas às outras na tentativa de criar algo novo. Um Greatest Hits com alguns êxitos, mas encaixados entre faixas que já ninguém consegue ouvir.