Os reboots nas franquias de videojogos representam um acto de audácia na indústria, muitas vezes implicando uma reimaginação completa do universo de um jogo. Essas decisões ousadas têm o poder de revitalizar uma franquia, trazendo-a de volta à relevância para uma nova geração de jogadores, no entanto, carregam também o risco de manchar um legado que tão difícil foi de criar.
Nunca é fácil reiniciar uma obra popular, porque implica, muitas vezes, um reinício total do enredo e das personagens, assim como mudanças significativas na perspectiva e jogabilidade. Por outro lado, os reboots oferecem uma oportunidade única para os estúdios explorarem novas direções e abordagens criativas, ocasionalmente dando uma nova vida a franchises que estavam perdidas no tempo.
Neste artigo, vamos explorar alguns dos melhores reboots na história dos videojogos e destacar como essas reinvenções impactaram a indústria e conseguiram unir diferentes gerações de jogadores.
Doom
Houve uma primeira tentativa com DOOM 3, mas a abordagem survival horror não foi muito bem recebida pelos jogadores no geral. Por esse motivo, a ID Interactive sabia que não podia falhar quando anunciou um full reboot de DOOM.
Temeu-se o pior, uma vez que o desenvolvimento passou por muitas dificuldades, mas as ideias eram boas. Foi finalmente lançado em 2016, e dificilmente teríamos um DOOM tão perfeito. Os elementos que construíram a reputação de tão importante saga estavam todos lá, e muito foi acrescentado, com mecânicas que podíamos encontrar nos FPSs mais modernos.
Revigorou por completo a franquia e colocou novamente a ID Software na ribalta como um dos principais estúdios na criação de First Person Shooters. Hoje é um dos principais shooters de acção do mercado, e conseguiu com isso inspirar outros estúdios a seguirem o mesmo formato quando idealizam jogos que partilham o mesmo estilo. Um dos maiores reboots de sucesso da última década.
Batman: Arkham Asylum
É uma personagem que inspirou inúmeros jogos ao longo dos anos, porém, foi a Rocksteady que parece ter encontrado o fórumla ideal para que tudo aquilo que o Dark Knight representa fizesse mais sentido em termos de gameplay.
Marcou o início de uma trilogia, e ainda num formato mais linear do que os jogos seguintes, traçou o caminho não só os princípios a seguir nas sequelas, como na maioria de jogos de super-heróis. A lógica dos sistemas de combate e de progressão ainda hoje são copiados pela concorrência, e ainda hoje é a maior referência do género.
Grand Theft Auto 3
Foi o título que deu o passo seguinte na franquia, largando a perspectiva top-down dos dois primeiros jogos, e adoptando uma visão na terceira pessoa. A franquia ainda não tinha a popularidade que tinha hoje, e esta decisão certamente ajudou a projectar ainda mais um nome que já começava a reclamar atenção.
Também começou a dinâmica de jogabilidade que temos hoje, onde a história ganha uma importância central, assim como as actividades secundárias que são únicas nos jogos de mundo aberto da Rockstar. Grand Theft Auto 3 foi crucial para estabelecer a atmosfera urbana e criminosa do jogo, com uma jogabilidade fluída e uma narrativa que encaixava na perfeição na liberdade de exploração e na acção oferecida pelo jogo.
Wolfenstein: The New Order
Em 1992 nasceu o primeiro First Person Shooter com Wolfenstein 3D, e dificilmente imaginariam que tinham acabado de criar um dos géneros mais importantes dos videojogos. Contudo, por incrível que pareça, foi uma franquia que ficou esquecida, e foram necessários 20 para repescada com um primeiro reboot – Return to Castle Wolfenstein.
Todavia, não teve o sucesso que a Activision desejava, e após mais duas tentativas falhadas com Wolfenstein: Enemy Territory (2003) e Wolfenstein (2009), passou os direitos para a Bethesda. E foram estes últimos que, após entregarem o desenvolvimento de Wolfenstein: The New Order ao estúdio MachineGames, encontraram a receita ideal para que hoje seja realmente apreciado.
Ao contrário de esmagadora maioria dos FPS’s em que temos os nazis como inimigos, a nova vaga dos jogos de Wolfenstein oferece uma vertente mais humorística e de acção exagerada. Mas na verdade é como parece funcionar melhor, oferecendo um gameplay frenético e uma história muito bem escrita e enriquecida com personagens interessantes, especialmente o protagonista, B.J. Blazkowicz.
God of War
Apesar de ser uma das maiores marcas da PlayStation e ter um sucesso que era praticamente impossível de ameaçar, a verdade é que até Kratos teve de se ajustar à modernidade. No entanto, olhando para a legião de fãs que foi conquistando ao longo dos tempos, seria sempre uma mudança sensível e que a Santa Monica Studios teria de gerir com pinças.
Foi uma transformação completa, passando para uma perspectiva em terceira pessoa, mas que resultou em pleno e ganhou inclusivamente o The Game Awards de 2018. A jogabilidade de acção foi mantida, mas com um sistema de progressão mais actual e inovando em vários pontos.
É um bom exemplo de como a Sony é mestre em renovar as suas IP’s e em entregar os seus principais projectos aos estúdios certos. God of War continua a reinar, e foi muito graças a este reboot que soube reacender a chama de um protagonista que é fundamental para a Sony e a PlayStation.
Fallout 3
Embora seja hoje uma das IP’s mais importantes dos videojogos, foi com Fallout 3, que começou a ganhar a dimensão que tem hoje. Os dois primeiros jogos foram desenvolvidos pela Black Isle Studio, num formato RPG mais clássico, em visão isométrica, contudo, com um lore complexo e interessante que atraiu o interesse da Bethesda, acabando depois por comprar os direitos de distribuição.
A Bethesda tinha um plano para tornar o terceiro jogo da saga mais apelativo, ou seja, usar o mesmo conceito de Elder Scrolls no sistema de quests e facções, e claro, passar para uma perspectiva na primeira pessoa. Resultado? Fallout 3 foi um sucesso imediato, e tornou esta franquia numa das preferidas de muitos jogadores. E basta olhar para o êxito que a série de TV está a ter para percebemos a riqueza do seu universo e da sua narrativa.
The Legend of Zelda: Breath of the Wild
A seguir a Mario, dificilmente encontramos um nome tão importante para a Nintendo. O número de jogos lançados deste franchise ultrapassa as duas dezenas, e é sempre um grande acontecimento para os fãs quando é anunciado mais um título.
The Legend of Zelda: Breath of the Wild iria marcar o ciclo seguinte da série, já que havia a necessidade de revitalizar a franquia, de maneira a poder concorrer com os RPG’s mais modernos. E tinha ainda a pressão de poder mostrar as capacidades da Nintendo Switch, sendo um dos jogos de lançamento. A responsabilidade era enorme.
Não se deixou intimidar, e o resultado foi uma verdadeira obra de arte, ajudando a impulsionar as vendas da consola. Não só isso, como foi o grande vencedor do The Game Awards de 2017, ficando assim imortalizado o seu merecido sucesso. A arte, o gameplay e a narrativa estabeleceram novos padrões para o género, e inspira, ainda hoje, muitos estúdios na criação de novos jogos.
Tomb Raider
Não deverá haver na história dos videojogos uma figura feminina tão importante como Lara Croft. Lançado em 1996, Tomb Raider tornou-se rapidamente um dos principais jogos do momento, e a maior prova é que tivemos um novo jogo a cada ano até 2003. A febre, contudo, foi perdendo intensidade, e em 2013 tivemos um reboot que mudaria por completo o conceito da saga.
Pensado para ser o primeiro jogo de uma trilogia, a intenção era contar a história de Lara Croft desde o seu começo, e desenvolver a personagem ao longo dos três jogos. Foram igualmente adicionados elementos que aproximaram mais de um RPG, mas sem perder a linearidade e o estilo de plataformas que caracterizaram a série. E de facto a forma como a Square Enix repensou a jogabilidade e a narrativa não podia ser mais perfeita, entregando uma das melhores trilogias de sempre.
Prince of Persia: The Sands of Time
Nasceu no final da década de 80 um dos mais revolucionários jogos de plataformas da altura. Criado por um estúdio americano desconhecido com o nome de Brøderbund, foi um jogo que não só inovou em termos de gameplay e animações, com fundou um género, posteriormente continuado com jogos como Another World e Flashback (ambos desenvolvidos pela Delphine Software).
E se é um exagero dizer que foi um one-hit wonder, há que reconhecer que nem Prince of Persia 2: The Shadow and the Flame, ou Prince of Persia 3D: Arabian Nights conseguiram atingir o sucesso do primeiro. Ainda assim, a Ubisoft viu o grande potencial do IP, e depois de adquirir os direitos do mesmo, decidiu lançar Prince of Persia: The Sands of Time.
Foi uma transformação total. Mudou para uma perspectiva na terceira pessoa, e trouxe um sistema de combate e de plataformas muito mais actuais, adicionando ainda a mecânica de manipulação do tempo que se tornou depois fundamental para os jogos seguintes da franquia. Foi um título que deu uma nova vida ao nome de Prince of Persia, e o catapultou para se tornar relevante novamente no mercado.
Resident Evil 7: Biohazard
O reinado de Resident Evil parecia intocável, mas o desapontante lançamento de RE 6 fez soar os alarmes, dando sinais de que a fórmula se poderia estar a esgotar. Nesse sentido, a Capcom tomou a decisão de alterar o rumo da franquia, e poucos estariam à espera de tamanha alteração de paradigma, o que demonstrou coragem, mas também confiança nas ideias que tinham preparadas.
Foi um jogo que não foi um êxito imediato, e demorou a ser aceite pelos fãs mais fervorosos, mas actualmente é visto como um dos melhores survivals da geração anterior. A perspectiva na primeira pessoa foi uma mudança significativa, e um indicador de que havia o desejo de que a atmosfera de terror fosse ainda mais imersiva. Tornou-se também uma experiência mais cinematográfica, com um investimento maior nas cutscenes, mas aparentemente a aposta foi ganha, já que foi dada continuidade a este novo formato com Resident Evil: Village.